10 de dezembro de 2011

A valorização das cenas musicais

Resenha crítica do texto “Indústria da música em transição”, Micael Herschmann. Apresentada no âmbito da disciplina "Modelos de Distribuição Musical" 2011/2 E.Midia UFF
Banda Solstício de Cabo Frio/RJ  http://www.facebook.com/solsticiorjhc 


A reconfiguração da indústria musical na era do download, a valorização da experiência e das cenas musicais

Em seu texto Micael Herschmann refuta a idéia de uma crise no mercado da música, cuja principal atingida seria a indústria fonográfica, ele aponta que na verdade, o mercado da música está passando por uma reconfiguração. Na busca por novos modelos de negócios, cada vez mais tem se valorizado a experiência do ao vivo e o conhecimento sobre o léxico simbólico de determinados gêneros e cenas musicais.

“É possível afirmar que jamais da história da música se produziu tanto com tanta liberdade, mas também mais do que nunca hoje os processos exitosos de distribuição, divulgação e comercialização de um repertório musical estão cada vez mais voltados para um mercado de nichos e exigem estratégias de grande complexidade” (HERSCHMANN p. 61)

O autor faz uma divisão entre a indústria musical do século XX e o momento atual no qual estamos vivendo, apontando rupturas e continuidades entre esses dois modelos, reforçando a idéia de que “a crise” se encontra na forma como era pensada a venda de produto e não na indústria musical em si, afinal nunca se produziu tanto e se consumiu tanto música como atualmente.

Com a digitalização da música e os softwares de compartilhamento a música em formato físico foi perdendo cada vez mais a sua importância. Uma vez que não era mais preciso comprar o disco ou o K7 para ter a música em sua discoteca, as “playlists” são uma reconfiguração da discoteca, o modelo de negócio que até então era praticado pelas gravadoras entra em colapso, sendo obrigadas a procurarem novas formas agenciamento.

É interessante pensarmos que não foi apenas o modelo de negócio que mudou, mas também a nossa forma de pensar a música como um produto. Em seu texto “Free: grátis o futuro dos preços, Chris Anderson apresenta o grátis como uma forma de marketing cada vez mais instituída, dizendo que ainda mais do que estratégia, o grátis passa a ser uma imposição, mesmo que a música não seja disponibilizada oficialmente, ela pode escapar por usuários que desejarem compartilhá-la com sua rede de amigos ou com o mundo.

“Onde a abundância derruba os custos de alguma coisa ao chão, o valor é transferido aos níveis adjacentes, o que o editor de Tim O’Really chama de ‘Lei da Conservação de Lucros Atrativos’.”(ANDERSON, 2009, p.53)

Herschamann observa que enquanto caem as cifras de venda de fonogramas em suporte físico, o “mercado de derivados” ganha maior relevância. É o caso dos eventos ao vivo, enquanto o disco é cada vez mais desvalorizado, as entradas de shows estão cada vez mais caras. Cada vez mais a indústria fonográfica ganha ares de “empresa de mídia”, realizando ações que buscam atender esse e “mercado adjacente”. Não se produz apenas discos, DVDs, gradualmente os negócios se estendem a produção de produtos audiovisuais para a promoção do artista, em turnês, merchandising (roupas, brinquedos, acessórios, etc.), entre outras práticas aonde a música acaba ficando, aparentemente, de lado.


Se por um lado assistimos a queda do modelo praticado até o século XX (antes do compartilhamento), vimos ganhar força e potência um novo modelo, que desde o final da década de 70 vem já vem se mostrando como alternativa ao mercado de massa, ou ao mainstream, falo de circuito independente de música, o underground. O Punk pregava o “Do It Yourself” e foi com essa ideologia que surgiram os primeiros selos independentes, assim como um circuito de produção, circulação e consumo desse material.

Segundo Herschmann o modelo atual tende a privilegiar a cultura de nichos atendendo a um mercado cada vez mais segmentado. Mas para atingir esses nichos é preciso ter o conhecimento necessário para que haja o diálogo entre o produto e o possível consumidor.

“Entretanto, muitas vezes não é percebido que os fatores culturais são vetores cruciais não apenas na ponta do processo (na forma de produto ou serviço), mas também no processo em si, e que agregam valor quando as organizações e agentes sociais buscam investir no universo simbólico que está associado a sua produção. Com isso eles abrem oportunidade para que processos de identificação e/ou mobilização de consumo se produzam de maneira mais efetiva.” (HERSCHAMNN p.75)

No entanto quem tem algum tipo de contato mais engajado com alguma cena musical independente, que configuram circuitos próprios, como o Hip-Hip, o Rock Alternativo e o Heavy Metal, sabe que essa nova prática por parte das indústrias, de valorização do conhecimento simbólico, da experiência ao vivo, dos produtos adjacentes e da comunidade, sempre foi uma realidade, não como uma forma nova de pensar o mercado, mas sim a forma de pensar o mercado.

Sem o suporte midiático essas culturas dependem de seus próprios circuitos para se estabelecerem, e os circuitos dependem da mobilização de cada um de seus agentes (bandas, produtores, público) para poderem existir. Esses atores por sua vez agem, em grande parte, por identificação à causa, pela questão do pertencimento àquele grupo, pois na maioria das vezes não existe o retorno financeiro, ou este não é satisfatório por si só (caso não houvesse a questão do reconhecimento).

Mas apesar da estratégia voltada para o nicho, e para a experiência não ser de fato nova para o circuito alternativo, os apontamentos do autor sobre um reconfiguração de mercado se fazem bastante pertinentes também para este grupo, pois este também passa por uma reconfiguração. Em meio a um número cada vez maior de artistas e bandas a grande pergunta é como se fazer ser ouvido, como levar público para os eventos. É neste momento que noto um maior diálogo do underground com as estratégias do mainstream.


Bibliografia
ANDERSON, Chris. Free: grátis: o futuro dos preços. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
HERSCHMANN, Micael. Indústria da música em transição. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2010.


Por: Natália R. Ribeiro

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